sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Conferência "Cerâmica Oportunidades de Futuro"

Confesso não ter estado presente na última Conferência organizada pelo jornal Região de Cister, “Cerâmica Oportunidades de Futuro”. Muito embora me interesse por esta área de actividade, a minha realidade diária nos últimos 7 anos ( dos 8 da minha vida profissional ), mesmo que curta, comparativamente aos empresários cerâmicos que contam com no mínimo décadas de experiência; achei que não traria qualquer mais valia participar na mesma, porque não me identifico com este tipo de actividades organizadas, onde muito se discute, mas depois em nada se passa à prática.

Cansam-me este tipo de abordagens, um conjunto de empresários reunidos, todos alarmados com a crise do sector, mas que terminado o encontro, tudo se esfuma, com a mesma rapidez de um cigarro.

Cansam-me abordagens como o INTERREG IV, onde o objectivo primário deste projecto, se dispersou completamente quanto ao âmbito, desviando-se do seu objectivo primordial. Ou seja, o objectivo último deste projecto deveria ter sido sempre, e sempre, a formação; e troca de experiências, apenas como acto complementar. No seu todo, o INTERREG pecou por se centrar apenas na troca de experiências...e esqueceu o essencial, que era implementar fortes estruturas de formação ao nível de marketing, que segundo o diagnóstico ( análise swot ) era preemente!

Não me alongando demasiado no projecto INTERREG IV ( se é que o vou conseguir!! ), que daria para mim tantas páginas de discussão, este foi, se não inútil, muito perto disso. A começar pelos inquéritos às empresas, muitas nunca chegaram a responder, ao processamento da informação, à forma quase “naif” como as consultoras diagnosticaram o sector. Eu interrogo-me onde andavam os consultores cerâmicos, que melhor do que ninguém poderiam processar as informações e retratar a panorâmica do sector no concelho de Alcobaça. Para as conclusões a que chegaram não teria sido necessário tantos meses de estudo e trabalho. Eu própria, numa das reuniões, mencionei, que para chegar aquelas conclusões, no meu curto espaço de tempo laboral, já o concluira há muito tempo, mesmo não sendo uma alma iluminada ( pelo menos não assim me considero ). Basta conhecer minimamente as empresas, e saber que temos know how ( algumas, penso eu ), que temos de apostar mais no design ( elementar e dado adquirido há anos ), apostar mais no marketing ( o que parece que teima em não entrar na cabeça de alguns ), etc, etc...Mas isto é tudo muito difícil de diagnosticar num todo, porque penso que temos um pouco de várias realidades, empresas realmente profissionais e bem dotadas, com artigo de qualidade, com visão estratégica ( muito poucas, quase que reduzia a duas...); empresas com algumas debilidades na qualidade, e certas carências, mas vão resistindo ( bastantes ) e, por último, empresas de vão de escada, sem qualquer profissionalismo, organização ou visão empresarial ( demasiadas, a meu ver ).
Ora, por tudo isto, penso que uma análise ao sector, nunca poderia ter tratado tudo como um todo, mas sim nas várias realidades existentes, o que não foi feito. Esta distinção deveria ter sido sempre feita, mas não foi.
Depois, permitam-me esta pequena ironia, um trabalho onde a empresa consultora contratada, apresenta na capa uma imagem de um artigo em porcelana, quando deveria ser faiança, parece-me no mínimo desajustado, certo? Afinal de contas, todas as empresas diagnosticadas eram de faiança.
Não querendo mais esmiuçar tão falado relatório final com a análise do sector cerâmico no concelho, se é que me é reservado esse direito, mas penso que estou apenas a usar da minha liberdade de expressão e opinião. Penso só, e acredito, que com algum esforço conseguiriam ter feito melhor este apuramento de necessidades, e na identificação dos pontos fortes e fracos das empresas.
Ponto assente, e quase unânime, era a falta de vocação comercial das empresas, ausência de estratégias de marketing e má utilização dos canais de mercado. Recordo-me de numa reunião, um empresário dizer, “eu faço cerâmica, mas admito que não sei vender” ( aqui as minhas desculpas por não me recordar do autor )
Posto isto, pergunto-me, quanto da verba disponibilizada pelo Programa comunitário foi empregue em formação de comerciais destas empresas?
E para terminar, ainda não percebi porque é que certas empresas são indicadas no programa como “boas práticas”, estando em pleno processo de recuperação, não apresentando o melhor estado de saúde. O que estávamos a espera? De apresentar à delegação dos parceiros estrangeiros do projecto, fábricas fantasma? É que poderíamos ter corrido esse risco. Fica a minha opinião, deveriamos ter sido cuidadosos na atribuição da qualidade de “boa prática” a certas empresas. Se me disserem, que em determinado sentido, foram no PASSADO, exemplos de boas práticas, eu concordo em absoluto. Mas o INTERREG IV decorreu em 2009/2010, não há meia dúzia de anos atrás. Não era suposto apresentar as boas práticas de hoje? Se há empresas perto de sucumbir, como podem ser exemplo de boas práticas? É porque por si, não foram assim tanto boa prática, para chegar ao estado actual em que se encontram.
O que melhorou o INTERREG IV no sector até agora? A tão cobiçada verba de 200 mil euros, que muitos confundiram como sendo distribuídas sob forma de subvenção ( que para muitos motivou a desistência quando assim perceberam que não era ), mas que afinal deveria ser empregue em acções concretas...que benefícios trouxe ao sector? É que de resultados, que se traduzam na prática, em algo visível, para mim Zero. Algum enriquecimento pessoal/profissional a quem participou nas delegações ao estrangeiro, mas que aplicabilidade teve no sector em geral?
Onde estão ideias que foram discutidas, de criar plataformas comuns de vendas? Parcerias? Etc etc... Como já referi, à saída de cada reunião, ali ficavam esquecidas no tempo.

As infindáveis discussões dos custos energéticos, consumos de gás, mais apoios do Estado...que pressão foi feita junto das respectivas entidades? Que foi feito pelo nosso executivo junto dos Ministérios e do governo, de forma a criar Medidas de Excepção para o sector??

É por tudo isto que me cansam intermináveis discussões de horas, para depois nada ser feito.
É por tudo isto que desmoralizo e não me apetece ir a conferências sobre o tema, para ouvir mais do mesmo...
É por sentir que somos pequenos em ideias, e que julgamos que somos os maiores quando falamos em inovação, parcerias? Pensamos que estamos a chegar a conclusões brilhantes, quando estes temas são já passado para muitos. Parcerias deveriam ter sido feitas há dez anos atrás. Inovação, deveria ter sido palavra de ordem nos últimos anos. Design, uma prioridade, mas acima de tudo o Marketing...aqui está a chave, a linha da frente. Marketing agressivo, personalizado, dirigido ao cliente.

Tenho vergonha, que só tenhamos chegado a estas conclusões demasiado tarde...mas mais vergonha, por nos sentirmos orgulhosos ao pensar que chegámos a soluções; quando outros chegaram lá dez anos antes de nós!

Sinto ainda alguma curiosidade, em saber o que leva agora empresas falar em parcerias, quando há cinco anos viviam de costas voltadas. Porque lhes dá mais jeito, para vós a parceria só faz sentido quando estão ameaçados? Com o que podem lucrar uns dos outros? Parcerias centradas em egoísmos próprios e assentes em princípios por si só já fracos, lamento mas não resultam.

Há dez anos que poderiam ter criado uma marca Alcobaça, trabalhar em conjunto através de parcerias, negociar preços com fornecedores com base nas quantidades que em conjunto conseguiriam atingir, criar plataforma de promoção da cerâmica, utilizar quadros comunitários dirigidos para o efeito, especializarem os vossos comerciais em marketing, subcontratação, formação, formação, formação...entre muitas outras ideias, e outras ainda por imaginar ( a quem ainda quiser pensar sobre este assunto )

Mas, há dez anos, eu compreendo, porque não o tenham feito, não era necessário...pois não? Que investimentos fizeram nas vossas fábricas nos últimos anos? Quantos de vós não tem problemas de qualidade no artigo, devido a problemas de infraestruturas?

Retomando à Conferência, pelo que li na imprensa, falam na necessidade de atrair jovens para o sector? É uma boa questão...já se interrogaram onde eles estão? Não é com estas condições que lhes oferecem ( e aqui discordo também com o que foi referido na conferência, o sector é definitivamente mal renumerado ), esta falta de profissionalismo e ausência de visão empresarial que querem cativar jovens licenciados e preparados para o comércio internacional?

Conseguem perceber os níveis de frustração de um jovem, dinâmico, que conhece de cor as estratégias comerciais, ver um conjunto de empresários a discutir princípios básicos, como se fossem iluminadas conclusões, e só se aperceberem em 2010, que têm de apostar na inovação, parcerias, captação de jovens e pressionar apoios estatais?? Isso já era! Agora em 2010, temos de chegar a outras conclusões um pouco mais adiante, se não queremos que outros nos alcancem.

Costumo brincar, que a concorrência chinesa não me incomodaria, nem atrapalharia, se quando eles copiassem um modelo, já nós tivéssemos inventado um diferente...Contudo, nós fazemos precisamente o contrário, porque não nos soubemos manter na pelotão da frente. Hoje, copiamos ou inspiramo-nos em modelos deles ( vejamos recentes prémios de design ganhos pela LOVERAMICS, com designers chineses )...

Por último, não quero nem tocar no assunto da gestão caseira de cada um na sua empresa...primeiro porque já tive oportunidade de escrever sobre isso ( já em 2008 ), algures no Região de Cister, com “Inovação...Precisa-se”, mas deixar apenas uma nota condenatória aos que fizeram das empresas verdadeiros institutos familiares, de amizades e cumplicidades, coisa tão pouco profissional e tacanha, bem ao modo provinciano. Isto traz custos, pouca eficiência, mas é sobretudo tão pouco atractivo para qualquer profissional que se preze.. Outros, onde verdadeiras famílias dependiam de renumerações oriundas da empresa, sem muitos deles terem lá colocado os pés...muito disto descapitalizou empresas.

Para terminar, um conselho, de alguém muito novo, que esta semana me ensinou uma fábula sobre a formiga ( que armazenou a comida durante o inverno ) e a cigarra que todo o ano cantou. Poupança.
Muito provavelmente, as duas únicas coisas acertadas que saíram daquela conferência foram as seguintes mensagens “poupança e tolerância zero ao recuo”, proferidas pelo consultor cerâmico Alberto Silva; e o Turismo Industrial, que é definitivamente um dos caminhos a seguir. E com este, após os impasses, fracassos e erros crassos da tentativa de criar uma Rota da Cerâmica ( que funcionava a passos lentos ), levou uma empresária ( CEO Arfai/IGM Lda ) a agir unilateralmente. Assim se distinguem os grandes, dos pequenos. A Turicer, sob sua alçada, é para mim o melhor aproveitamento do sentido de oportunidade que devemos premiar e distinguir como inovador, nos últimos anos.

Uma palavra de incentivo para que combatam e se façam ouvir, pelos aumentos súbitos e sem pré-aviso, que os apanharam desprevenidos ( ERSE ). Não deixem adormecer o assunto, há formas de apresentar o vosso manifesto!

Devem ter reparado, que não culpabilizei a conjuntura internacional, pela crise do sector...não acho que tenha um papel assim tão determinante nos problemas que estas empresas atravesssam. Foi agravante, dificultado pela concorrência, algum distanciamento do mercado americano, mas...por si só não fatal.

E a este propósito, vos deixo o seguinte, que bem pode ser aplicado ao nosso sector. Sublime.

“Não há sectores condenados”
A Revolução do TêxtilFoi o primeiro sector da economia a sofrer o embate da abertura de mercados. Muito por culpa da mão-de-obra barata em que assentava a sua competitividade. O que sucedeu a seguir é conhecido: falências em massa, aceleradas pela abertura dos mercados às importações da China e Índia. Não tardou que aparecessem as habituais carpideiras a sugerir que não havia lugar para o têxtil.A experiência recente mostra que não é assim. Veja-se o aparecimento de empresas cujo modelo de negócio não assenta na mão-de-obra barata mas no valor acrescentado (com inovação à mistura). Quem visitar a cintura industrial têxtil constata que, no meio dos destroços fumegantes de empresas que não se adaptaram à mudança, estão a nascer unidades empresariais de ponta. Com capacidade para competir com os melhores. Como as empresas que fornecem equipamentos de ponta aos atletas, de várias nacionalidades, presentes nos Jogos Olímpicos (v.g. a Petratex, cujo fato de banho está a fazer cair recordes do mundo na natação). Empresas que já não se limitam a fabricar, mas a inovar. E a patentear as inovações, verbo até há pouco inexistente no dicionário da gestão portuguesa. O que se está a passar na indústria têxtil é a confirmação de que não há sectores condenados. Há empresas bem e mal geridas. Cortesia da abertura dos mercados, que obrigaram os empresários a usar a cabeça, em vez do proteccionismo, para sobreviver.Camilo LourençoIn Jornal de Negócios ( 2008 )


E vos deixo a minha frase preferida, a todos os que ( como eu ), e ainda que cansados, ainda tentamos resistir.


"Mais querer, mais imaginação e mais coragem..."
Ferreira da Silva ( 01.02.2009 ), pronunciando-se acerca do segredo para ultrapassar a crise na cerâmica.